LUZ, CÂMERA E HISTÓRIA: O FILME NA SALA DE AULA

LUZ, CÂMERA E HISTÓRIA: O FILME NA SALA DE AULA

O projeto de pesquisa e extensão Luz, Câmera e História! o filme na sala de aula
foi idealizado pelo historiador Rodrigo de Almeida Ferreira e implementado no Centro Universitário UNA (Belo Horizonte/MG), em 2009. A proposta é refletir sobre o uso pedagógico de um filme e seu papel na educação não-escolar, ou seja, referente a qualquer espectador, estudante ou não, especialmente em relação a temas ligados à História, política e cidadania.

O projeto favorece aos graduandos dos cursos de História e de Pedagogia da UNA discussões qualitativas referentes à relação entre o cinema e a educação. Um segundo momento das atividades do grupo é a exibição comentada de filme para a comunidade escolar de ensino básico. Trata-se de um espaço de integralização entre a teoria e a prática docente. No campo social, as sessões comentadas favorecem o contato de estudantes do ensino básico com o mundo universitário. São momentos em que ocorre a universalização do saber acadêmico junto à comunidade.

terça-feira, 24 de julho de 2012

LUZ, CÂMERA, HISTÓRIA! O FILME NA SALA DE AULA


ASSISTIU... NA ESTRADA




On The Road - Na Estrada: 
do livro à telona; da telona à sala de aula

Liberdade. Uma palavra cujo significado é difícil precisar.
Jack Kerouac, escritor norte-americano, mergulhou nessa aventura. Não na tentativa de conceituá-la, mas para experenciá-la. Seu romance On The Road (Na Estrada) foi escrito a partir das suas vivências em viagens pelos Estados Unidos e México. Para dar conta do ritmo alucinante com que redigia, colava os papéis para não precisar trocá-los na máquina de escrever. Uma viagem sem paradas. O volume redigido assustou o editor, que lançou a primeira edição em 1957 – seis anos depois de receber os originais.
A trama é simples: Sal Paradise (espécie de alterego de Kerouac) põe o pé na estrada em uma viagem pelo país com seus amigos, em especial Dean Moriarty a quem admira com seu jeito louco e sedutor. O livro é resultado do rememorar dessas aventuras.
Mas a simplicidade para por aí. A densidade das experiências revela as angústias daquela geração nascida em meio a grande depressão capitalista de 1929, do entreguerras (1918-1939), das ditaduras fascistas e comunistas e dos horrores da 2ª Grande Guerra (1939-45). O mundo parecia pequeno demais segundo os valores do american way of life (o modo de vida americano).  
Kerouac, assim como outros jovens escritores, músicos, artistas, procuraram um caminho fora dos padrões. Puseram-se a percorrer o mundo, contestando-o. Um exercício para decifrá-lo, entenderem a si mesmos e tentar mudar a realidade. Experimentar era o método. Whisky, maconha, benzendrina e outros fármacos estavam na dieta. Quebra de tabus sexuais, orgias, homossexualidade rompiam os pudores e moralismo. Naturalmente, tamanha entrega tinha o seu preço: ressaca corpórea, mental e emocional. Mas fazia parte do processo para se conhecerem, se libertarem e favorecer a criação artística.
Esse grupo, no qual se destacam também, entre outros, Allen Ginsberg, William Burroughs, Gregory Corso, gritou alto e ecoou no mundo ocidental: ficou conhecido como a geração beat, ou beatniks. Em meados de 50 outros jovens artistas foram associados ao movimento dado seu modo criativo e contestador das regras sociais. Nos anos 60, em meio à guerra fria, ditaduras, guerra do Vietnã, discriminações étnico raciais, contestações em todo o mundo capitalista e socialista explodiram. Os protestos políticos e sociais passaram pelos códigos culturais e comportamentais. Uma década de protestos na qual os beatniks foram alçados ao Olimpo. Inspirados em Kerouac, Ginsberg e companhia, as novas gerações certamente vivenciam um sentido de liberdade bem distinto daquele da primeira metade do século passado.

On The Road é, portanto, um estandarte da geração beat. Um testemunho histórico de uma revolução cultural. Adaptar toda essa densidade para o cinema não é tarefa fácil, como atesta o fato de nenhum diretor e produtor terem encarado o desafio – aparte o livro ser uma referência formadora entre a maioria quase absoluta do mundo artístico.
Coube ao diretor brasileiro Walter Salles Júnior (Terra Estrangeira, Central do Brasil, Abril Despedaçado, Diários de Motocicleta) a tarefa. Felizmente, a lacuna foi preenchida e com bom resultado de adaptação da linguagem literária para a cinematográfica. Mais uma vez o diretor se vê às voltas com um road movie (filme de estrada), cuja dinâmica segue o ritmo de uma viagem. Sua experiência nesse gênero reflete na segurança com que dirige o filme: tomadas, enquadramentos, luz, cortes e montagem, enfim as especificidades técnicas que lhes credenciam como um respeitado diretor. A adaptação do roteiro ficou a cargo de Jose Rivera, enquanto a linda fotografia tem créditos de Eric Gautier (ambos trabalharam com o diretor em Diários de Motocicleta).
Pode-se até encontrar algumas críticas quanto a uma idealização romântica do livro, exemplificada em um Sal Paradise quase blasé mesmo nos momentos em que as coisas não iam muito bem. De fato, ao ler o livro a angústia daqueles personagens-reais é a tônica da narrativa de Kerouac. Mas esses são o Sal, Dean, Camille, Marylou, Bull nas lentes de Walter Salles; e em nada prejudica o filme.
É um capítulo a parte a trilha sonora que conduz os personagens em sua busca desenfreada pela vida. No final da década de 1940, um jazz com fraseado rápido e experimental embala os freqüentadores de bares e inferninhos norte-americanos, indo ao encontro dos anseios da geração beat. E posso dizer que a sedução daqueles acordes e arpejos transpassa a telona e deixa a plateia chapada. Sair do cinema com vontade de comprar a trilha do filme não parece que será exclusividade de um espectador...

On the Road é um documento geracional, apropriado pelas gerações vindouras. O filme recoloca suas questões básicas: liberdade, criatividade, honestidade. Mas como trabalhar em sala de aula um texto e um filme com imagens tão fortes como as descritas cenas com muito sexo, muitas drogas, linguajar fora da norma culta, tudo isso envolto a um jazz sedutor?
Certamente observar a faixa etária é fundamental. Mas, mais do que uma questão de idade, o perfil da turma é que deverá orientar o planejamento para seu uso pedagógico. Por essa via, talvez um projeto interdisciplinar seja o caminho ideal. É perceptível o potencial das temáticas levantadas pelo livro/filme nos campos disciplinares da, entre outras, história, literatura, artes, música, geografia, bem como temas como sexualidade, drogas, família, cidadania; tão caros à formação estudantil. Temas que ainda provocam polêmica e por isso permanecem atuais. Mas que, como nos ensinaram os personagens da novela de Kerouac e pelos reais beatniks, precisam ser tratados de frente, problematizados com honestidade. Afinal, preconceitos e hipocrisia não condizem com a liberdade – nem de ensinar, nem de aprender.

(veja trailer do filme em: http://www.youtube.com/watch?v=uUzklNReJbs)

Para saber um pouco mais sobre o tema, vale a pena ler:


On The Road (Na estrada), de Jack Kerouac
Naked Lunch (Almoço Nu), de William Burroughs


Geração Beat, de Cláudio Willer



                           E ainda assisitir aos filmes :



 
Mistérios e Paixões (dirigido por David Cronenberg, 1991)
(adaptação de Almoço Nu – em infeliz tradução para o português)

                                             
     










Beat (dirigido por Gary Walkow, 2000)

















Rodrigo de Almeida Ferreira

Ficha técnica:

Diretor: Walter Salles
Elenco: Kristen Stewart, Amy Adams, Viggo Mortensen, Kirsten Dunst, Garrett Hedlund, Alice Braga, Sam Riley.
Produtor: Francis Ford Copolla
Produção: Charles Gillibert, Nathanaël Karmitz, Jerry Leider, Rebecca Yeldham, Walter Salles
Roteiro: Jose Rivera
Fotografia: Eric Gautier
Trilha Sonora: Gustavo Santaolalla
Duração: 137 min.
Ano: 2011
País: EUA
Gênero: Drama
Cor: Colorido
Distribuidora: PlayArte
Estúdio: American Zoetrope / Film4 / MK2 Productions / Video Filmes
Classificação: 16 anos
(disponível em: http://www.cineclick.com.br/filmes/ficha/nomefilme/na-estrada/id/17178)




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